6 de jun. de 2014

O COMPLEXO DE JONAS

 



Jean Yves Leloup

Jonas é aquele que foi chamado um dia: 'Meu filho, desperta e vai para Nínive, a cidade grande. Lá crianças estão matando crianças, jovens matam pessoas dormindo de madrugada, pais não estão nem aí com relação à juventude, todo mundo está pensando só em si... Vai para Nínive; lá a velhacaria é consagrada, os velhacos são aqueles que têm sucesso; uma pessoa pura, inocente, em Nínive, se falar num meio político, por exemplo, vai ser ridicularizada; uma pessoa honesta, pura, de bons sentimentos é motivo de riso... tem que ser esperta, tem que ser velhaca. Jonas, vai para Nínive, porque lá um jovem, se quiser demonstrar que tem um coração bom, se quiser ser bondoso, generoso, vai ser ridicularizado; tem que dar porrada! Jonas, vai para Nínive, porque esse povo está perdido; 40 dias mais e não haverá mais Nínive!' 


Vocês notam que essa é uma mensagem muito atual. E Jonas foi para Nínive? Não! Ele pegou um barco mas foi para um Társis, um local tranquilo. Isso mostra, como nós temos uma tendência a fugir de nossas missões. Primeiro, há uma consciência interna que nos desperta, que nos coloca de pé. Pode ser uma crise, pode ser um terremoto, pode ser uma perda... mas há um momento em que você fica de pé. Porém, há sempre um convite sedutor da covardia e Jonas foge da sua própria promessa e, então, vem uma grande tempestade. Isso nos ensina que, quando você foge do seu próprio caminho você atrairá tempestades; não só para você, também para as pessoas que estão ao seu lado.

E de novo, Jonas é despertado lá no porão do navio, e o Capitão diz: - O que você faz aí? Todos nós estamos rezando para os nossos deuses! Esse barco vai naufragar! Esse Titanic, não suporta mais! E de novo, Jonas é colocado de pé! O capitão representa a cabeça, representa às vezes essa dor de consciência que nós sofremos e que às vezes nos impõe uma insônia, nos impõe uma dor de cabeça, nos impõe uma doença... As doenças que vêem da profunda inteligência do nosso organismo. A doença não é ruim; se você a escuta ela se torna um texto sagrado a ser interpretado. Ela tem uma mensagem: a doença é um fax que você recebe e que diz: 'Você se desviou do seu caminho'. Eu levei muitos anos para aprender isso: quando nos desviamos do nosso caminho nós atraímos doenças, acidentes, nós atraímos infelicidade. Acontece que vivemos num momento tão perdido que dizemos 'tomou doril...'

 Não interpretamos e o telefone continua tocando; às vezes em outros números até que pode ficar tarde demais. Então, Jonas que estava dormindo no porão do navio, novamente foi colocado de pé pelo capitão que indaga por que ele não está clamando por seu Deus, como todos os outros. 

Jonas era um fujão mas era, também, um homem sincero que me faz lembrar o poeta Omar Khayyan que inicia o seu Rubaiyat dizendo: 'Todos sabem que meus lábios nunca murmuraram uma oração. Não procurei nunca dissimular os meus pecados. Ignoro se existem realmente uma Justiça e uma Misericórdia. Mas, se existem, não desespero delas: fui sempre um homem sincero.' Quem pode dizer isso? Jonas foi sincero e disse : 'Eu sou a contradição, eu estou fugindo do meu Deus, estou fugindo da minha palavra, estou fugindo da minha voz mais profunda. Podem me atirar no oceano que a tempestade vai amainar.' Mas, os homens eram generosos e primeiro tiraram a sorte que apontou para Jonas.
O que é sorte? É o que Jung chama de sincronicidade mas, os antigos, chamavam de sinais: eles ouviam o trovão, eles ouviam a coruja que pia, eles ouviam a pedra no meio do caminho, porque sabiam que faziam parte do Universo. Sabiam que eles não eram destacados do Universo e nós perdemos essa orientação, essa consciência de participação. Tornamo-nos pobres diabos jogados num mundo sem sentido... É isso que o normótico crê de si mesmo. Portanto, Jonas mergulha no oceano. Esse é um outro ensinamento muito importante; como dizia um grande sábio, mestre Eckart, diante da Inquisição: 'Eu posso me enganar mas eu não posso mais mentir'. Há um momento em que você não pode mais mentir, você vai sofrer tanto, vai atrair tanta tempestade, que você vai resolver mergulhar mais cedo ou mais tarde, um dia todos nós mergulharemos no poço de nós mesmos. E aí, Jonas terminou no ventre do grande peixe e lá ele de novo disse: 'Eu vou para a minha batalha, eu juro de novo, eu faço solene promessa'. Essa história prossegue! Não é meu objetivo dissecá-la hermeneuticamente, porém esses textos são muito antigos e são muito atuais e são muito contemporâneos.

Em seguida, quero apenas ilustrar um pouco, através de alguns riscos, esse oceano onde Jonas mergulhou, esse poço que podemos chamar de ser humano. Sempre estamos aprisionados, isso ilustra bem o que somos; sempre estamos acorrentados, mas sempre podemos dar um jeitinho. 

É isso que eu sei desde que eu nasci! Eu sou desses que guarda uma marca, uma ferida e a memória mais antiga que eu tenho de mim mesmo, é de estar amarrado, de ser prisioneiro. Eu me via um menino com grades na frente. Eu não sabia falar sobre isso, mas eu me sentia um prisioneiro. Eu olhava para os meus pais e via também grades na frente. É muito estranho, mas a recordação mais antiga que eu tenho de mim mesmo é a de um prisioneiro entre prisioneiros. Muito mais tarde eu precisei vir aqui para a Papuda que é o presídio de Brasília, durante anos, eu dei assistência para o pessoal que fazia formação comigo, porque o tema da prisão, de estar amarrado, sempre me fascinou. E foi lá na Papuda que eu aprendi que a grande prisão é a ignorância existencial, é não saber quem eu sou, nem de onde eu venho, nem para onde vou. É mais fácil, isso eu garanto, você arrebentar as paredes da Papuda, do que você transcender essas amarras sombrias que nos prendem ao desconhecimento do ser. Portanto, isso é uma situação muito familiar.

Porém, eu tenho aprendido também que ninguém liberta ninguém e ninguém se liberta sozinho. E quando me convidam para uma palestra, eu venho. Não é para dar uma palestra, eu venho para me libertar, quem sabe! Porque nós nos libertamos num encontro. Isso eu tenho aprendido! Dar uma palestra seria muito pouco. 

Quem sabe, podemos ampliar um pouco mais o nosso espaço de liberdade. É através do encontro. Isto aqui vale alguma coisa pela promessa de possibilidade de encontro e isso não é nada fácil porque para nos encontrarmos precisamos estar na mesma onda, na mesma frequência. E se você estiver pensando no ontem ou no amanhã, dançou! Nós perdemos este instante que é o mundo, que é o aqui e o agora. É o tempo do encontro, é o tempo da transformação é o tempo do mergulho no poço. 



Amigos  este texto é muito significativo, por isso postei neste blog,para que possamos fazer muitas reflexões sobre a nossa vida.
Sublimes abraços
Norma



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